Artigo de opinião

Publicado em Edição 14

Um consumidor mais digital

Sejamos objetivos: em geral, a indústria seguradora não tem sido pioneira na transformação digital. Mas isso é compreensível. Na Microsoft, a par de empresas recentemente chegadas ao mercado, muitos dos nossos clientes têm um longo historial nos seguros e cresceram adquirindo outras empresas congéneres.

Por isso, lidam constantemente com diversas estruturas de distribuição, processos divergentes, sistemas antigos e mesmo modelos de exploração comercial baseados numa estrutura federativa. Contudo, a maior parte dos consumidores finais não sabe nada disso, nem se importa. Começam a estar habituados a fazer compras com um clique, conversar em tempo real com assistentes, a transmissões de vídeos ao vivo e ao atendimento instantâneo, de tal forma que já nem reparam nisso. 

E há quem comece a questionar: “Por que motivo não tenho a mesma boa experiência com o meu segurador ou mediador de seguros?” Isto não equivale a dizer que a transformação digital não esteja a acontecer no setor de seguros, especialmente após a Covid -19. Sem, dúvida, a vontade existe. E embora a nossa experiência profissional seja muito diferente, ambos acreditamos firmemente que a indústria tem potencial para somar um sucesso atrás do outro na próxima década. Para tanto, gostaríamos de partilhar três recomendações essenciais para todos os seguradores e corretores no futuro.

TRANSITAR PARA A CLOUD

Philip: Podem pensar que isto é óbvio, mas estamos a falar de muito mais do que tirar dados daqui e pôr ali. Assim que os dados estiverem na cloud, não estamos simplesmente a mudar de CAPEX para OPEX e a tornar-nos mais ágeis. Podemos fazer muito mais com os nossos dados. Podemos ampliar o que já temos com informação de terceiros e alavancar a Inteligência Artificial (IA) para criar conhecimento sobre os clientes que acrescente valor. Podemos diferenciar os nossos preços. Podemos melhorar a conversão e retenção. Podemos até personalizar uma conversa com o cliente omni -canal utilizando as capacidades da Microsoft na nuvem sem necessidade de adaptação dos produtos e serviços.

Assim que tivermos deixado para trás a infraestrutura local, teremos liberdade para experimentar, cometer erros rapidamente e melhorar o nosso negócio. Podemos acelerar a introdução de produtos no mercado e ultrapassar a concorrência implementando novos produtos e serviços mais rapidamente. Seremos capazes de introduzir inovações como a IA, compreensão de linguagem natural, reconhecimento de objetos, agentes digitais (bots) e desenvolvimento de aplicações Low Code/No Code. Com a cloud Microsoft Azure, podemos alavancar o mercado digital com soluções de seguro prontas-a-usar.

Jeroen: No que toca à simulação de riscos e tomada de decisões financeiras, trabalhámos com a MetLife para transferir os dados deles para a nossa plataforma Azure. Eles descobriram que conseguem fazer cálculos mais complexos e iterações de produtos mais depressa do que nunca. Isso tem-lhes dado melhores perspetivas e uma visão mais clara da sua posição face ao risco. E significa que agora o seu desempenho ultrapassa o do mercado, atraindo os bons riscos e deixando os maus para a concorrência.

Empresas como a MetLife são responsáveis por fundos gigantescos e, claro, precisam de assegurar que os utilizam da forma mais inteligente possível. Mas neste período com as taxas de juro extremamente baixas, isso torna- -se cada vez mais difícil. A tecnologia de computação remota na cloud permite aos seguradores tirar partido da IA e da aprendizagem automática no apoio à tomada de decisões críticas, à realização de investimentos mais inteligentes e sustentáveis e na antecipação dos movimentos do mercado.

A interação humana tornar-se-á um diferenciador importante no futuro e a tecnologia pode ajudar as empresas a aplicá -la ainda mais eficazmente.

REPENSAR TODO O PERCURSO DO CONSUMIDOR

Philip: A indústria ainda se debate com processos díspares e semiautomáticos, a burocracia em papel mantém-se, e circulam emails para trás e para a frente entre seguradores/corretores e clientes. Muito simplesmente, a resposta é repensar todo o percurso do consumidor a partir do zero.

Para quê digitalizar uma folha de papel com reconhecimento ótico de carateres se o formulário é o mesmo, tendo apenas passado para o ecrã? Pensemos em criar um percurso digital para o cliente que seja reimaginado do princípio ao fim. E depois exploremos como é que essa estratégia nos pode ajudar a simplificar a nossa carteira de produtos e impulsionar a personalização.

Jeroen: Trata-se de eliminar passos desnecessários com recurso à tecnologia. Por exemplo, neste momento é possível adquirir dados de toda a espécie de fontes e integrá-los nos processos — e ao fazê-lo, podemos reduzir o número de perguntas que precisamos de fazer aos clientes antes de lhes propôr um contrato de seguro. Vi alguns dos nossos clientes a passar de vinte perguntas aos consumidores para apenas três ou quatro. Há que começar a usar os dados mais inteligentemente para poder fazer o mesmo.

Outra forma de melhorar o percurso do consumidor é aliar a comunicação humana à automatizada. Algumas das capacidades mais impressionantes da nossa IA estão hoje no domínio do atendimento ao cliente. Isso significa que muitas interações podem ser tratadas por agentes automáticos com agentes reais a intervir consoante for necessário.

O seguro é por vezes um negócio emocional, especialmente quando as pessoas participam um sinistro. Por isso é importante manter essa ligação humana com os clientes, mas a tecnologia digital pode eliminar as tarefas repetitivas para libertar capacidade humana e assim ajudar ainda mais os clientes.

Também começámos a experimentar algo a que chamamos “análise do sentimento”, que pode avaliar o que uma pessoa sente quando telefona para fazer uma pergunta ou reclamação, e depois aconselhar os agentes em consonância. A interação humana tornar-se-á um diferenciador importante no futuro e a tecnologia pode ajudar as empresas a aplicá-la ainda mais eficazmente, por exemplo, criando uma transcrição automática e um resumo de uma conversa com um cliente com os melhores próximos passos.

Por que motivo não tenho a mesma boa experiência com o meu segurador ou mediador de seguros?

PENSAR O ECOSSISTEMA

Jeroen: Os seguradores não têm de andar a correr atrás dos outros. Há muito espaço para se anteciparem às mudanças e ganhar terreno. A forma de o fazer é pensar em termos de ecossistema. Vejamos o seguro automóvel como exemplo: há muitos elementos envolvidos. Temos os fabricantes, as oficinas, informação sobre o trânsito, previsões meteorológicas, os carros propriamente ditos, os condutores e os agentes da lei. É um ecossistema. Mas em vez de orquestrar o nosso ecossistema podemos participar noutro, por exemplo, adicionando os seguros a uma cesta de compras quando procuramos um telefone novo na Internet.

Philip: Pensar naquilo que o nosso ecossistema significa, considerando fatores que podem afetar a nossa empresa, e tomar medidas para nos prepararmos. Para continuar o tema do seguro automóvel, já existe tecnologia que permite aos veículos pedir assistência automaticamente quando têm um acidente. Assim, podemos facilmente imaginar um mundo em que o veículo também regista os danos, transmite fotografias e até faz uma avaliação.

O veículo poderia inclusive marcar uma visita a uma oficina e partilhá-la com o segurador/corretor sem intervenção humana. Como poderiam tais inovações influir na formulação de preços, atendimento ao cliente e regularização de sinistros?

Podemos até olhar para um mundo pós-Covid -19, com digitalização crescente e mais seguradores digitais a entrar no mercado e perguntar: “Qual é a nossa posição no ecossistema e como tiramos partido da tecnologia de computação remota na cloud para nos diferenciarmos aos olhos do consumidor final?”

Estas questões são prementes – e devemos começar por olhar para o nosso ecossistema.

VER MAIS

AUTORES

Philip Lobatto

Philip Lobatto

Senior Industry Executive for Insurance - Microsoft

É Senior Industry Executive for Insurance na Microsoft.
Tem um Mestrado em Direito e trabalha na indústria tecnológica há mais de 22 anos. É um veterano de 15 anos na Microsoft e perito na indústria seguradora, concentrando -se em grandes empresas na esfera geográfica de doze países europeus. Colabora estreitamente com equipas de vendas locais durante os compromissos dos CxO e aconselha os seguradores sobre tudo o que a Microsoft e os seus parceiros podem fazer para acelerar a sua transformação digital. Lidera a comunidade de seguros na sua região e leva a cabo avaliações de valor de empresas para seguradores dos ramos Vida e não -Vida.

Jeroen Kuiper

Jeroen Kuiper

Senior Technology Strategist - Microsoft

É Senior Technology Strategist na Microsoft. Tem mais de 26 anos de experiência na indústria financeira e, em 2008, fundou a Allsecur, filial da Allianz, que geriu durante 11 anos como CEO. Entrou na Microsoft há 2 anos e o seu papel principal é aconselhar os órgãos de administração dos principais institutos financeiros da Microsoft nos Países Baixos para dar visão ao seu percurso de transformação digital com recurso à tecnologia de computação remota da Microsoft.